À Ausência de Respostas
Não
pude esquecer o que me aconteceu alguns meses atrás. Fui chamado às pressas
para fazer a cerimônia fúnebre de uma pessoa que falecera com esclerose múltipla,
no dia dos finados. Havia muita gente no cemitério, por conta do dia do
feriado. Eu imaginei, quando cheguei ao local, que se tratava do velório de uma
grande personalidade de Niterói, dado ao número vultuoso de pessoas no
cemitério da Colina, em Pendotiba, Niterói.
Quando
me foi dada a oportunidade – lembro-me –, eu preguei uma mensagem sobre a
importância de vivermos a vida de forma coerente, produtiva, sendo solidário,
fraterno, sempre construindo pontes em vez de muralhas. No término, via-se
algumas pessoas com os olhos marejados de lágrimas, pelo momento e pela circunstância
que envolvia o ambiente. Algumas dessas pessoas vieram me cumprimentar
agradecidos pela palavra que foi dada. Uma dessas aproximou-se de mim, com toda
a cerimônia exigida pelo momento, e falou, sereno, ao meu ouvido: «Eu sou ateu,
mas fiquei impressionado com o que você disse. Parabéns!».
Após
aquele momento, acompanhamos o cortejo fúnebre até que o corpo fosse enterrado.
Voltamos. No retorno, mais uma vez fui abordado pelo mesmo homem, que me chamou
e disse novamente:
– «Você
costuma dar palestras em algum lugar?»
– Só na
Igreja e em alguns Seminários – respondi.
Então,
ele continuou:
– Eu
sou ateu, mas gostei do que você disse. Queria ouvi-lo de novo.
– «Eu
também sou ateu» – lhe
retruquei. Não creio no «D’us» que você diz não acreditar.
– Para
mim, Deus é ausência de resposta – retrucou-me o homem.
– Este
é o pensamento de alguns filósofos. Mas para mim Deus é a resposta à
ausência total de respostas – asseverei.
O homem-ateu saiu impressionado por ouvir a declaração de um pastor que não acredita no “D’us” que ele acredita não acreditar.
É a
partir da visão reeditada de um teocentrismo medieval esmagador que Jean
Paul Sartre, expoente do existencialismo do lado francês, dizia que «se o
homem é livre, Deus não existe. Se Deus existe, o homem não é livre».
É sobre
esta concepção medieval que Rubem Alves diz que «para que a ideia de democracia
viesse a existir no mundo, os homens precisaram deixar de acreditar em Deus».
Para Altaizer, no entanto, o homem só passa a ser livre realmente quando
consegue erradicar Deus da sua história. Esta leitura não apropriada sobre
Deus fez o teólogo Fredrich Vahanian discordar da posição radical de Altaizer.
Para Vahanian não devemos negar a existência de Deus. O que, segundo
ele, realmente precisa ser feito é combater a concepção distorcida que as pessoas
têm de Deus. Esta distorção começa a partir de que Deus seja transformado na
imagem e semelhança do próprio homem. É sobre esta fatídica possibilidade
que Von Rad, teólogo contemporâneo, fala. Ele diz que o homem piedoso é o
que corre mais perigo de transformar Deus à sua imagem e semelhança.
Corremos
perigo iminente de transformar Deus numa ausência de resposta, na medida em que
fazemos um culto com formas estreitas e tentamos monitorar as ações de Deus, ou
ainda porque só o concebemos por uma ótica religiosa.
A visão
que a igreja tem de Deus quase sempre O transforma na imagem e semelhança de si
mesma. Eu adiro ao pensamento do escritor evangélico que diz que não apenas os
pagãos, mas os cristãos têm um Deus à sua imagem e semelhança. O Deus de suas
teologias sistemáticas, dogmas, projeções, de forte componente antropomórfico e
antropopático, sintonizado com as fraquezas e limitações humanas. Não só a
visão da igreja, mas também a sua missão, o seu comportamento, a sua presença,
as suas idiossincrasias refletem o conceito de Deus que ela possui. Ou seja: o
conceito, a teologia, a doutrina que a igreja tem de Deus, termina tomando o
lugar de Deus. A rigor, toda verdade oficial, convencionada, estereotipada,
estratificada sobre Deus é segundo à imagem e semelhança daqueles que a
constroem.
Por
estas e outras razões, a igreja tende a pensar Deus a partir dos seus
preconceitos e a reduzi-lo ao tamanho da teologia que O forja.
A
igreja evangélica no Brasil, anestesiada pela alienação, pelo medo, pela
acomodação, pelos privilégios, pela «teologia» caipira norte-americana que nos
afoga, parece ter perdido a visão do reino e sua responsabilidade em sua
implantação.
Tudo
isso faz com que a visão do Deus verdadeiro, mostrado por Jesus Cristo, seja
totalmente prejudicada.
REV. PAULO CESAR LIMA
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