sexta-feira, 25 de abril de 2014

Guerra Espiritual

Guerra Espiritual 

 
Nos últimos dias, tenho ouvido as mais estapafúrdias, hilariantes, desconexas e incoerentes argumentações sobre este assunto. Alguns, numa expressão de pura apelação, chegam a sugerir que estamos falando pouco do diabo e que deveríamos investir mais neste assunto. Outros – filosoficamente – idealizam um mundo dominado por forças estranhas que, todo o tempo, invadem a privacidade de cada filho de Deus.
 
 
Esperem aí! O que está acontecendo com os evangélicos, na atualidade? Será que temos agora que investir todo o nosso tempo falando das peripécias de satanás e do seu poderio? Ora, convenhamos, temos mais o que fazer em vez de ficar perdendo tempo em querer cercear a liberdade do diabo da maneira mais inocente e inofensiva possível. Satanás já está sob condenação, pois Jesus Cristo ao subir ao Gólgota para morrer por cada um de nós destronou o império da morte expondo o diabo à vergonha.
 
Suponho que acreditar no que Jesus já fez por nós e declarar a sua vitória constantemente no nosso viver diário, não significa neutralidade, quietismo. Acredito, sim, que enquanto estivermos agindo de forma indiferente quanto aos apelos sociais, estaremos sendo escapistas e neutros de verdade.
 
 
Pelo amor de Deus, agora começaram a afirmar que as pregações sobre o diabo têm se ausentado dos púlpitos das igrejas. Tenho a plena certeza de que estas pessoas não estão por dentro da neurose que vem causando nas pessoas a ideia de um mundo tenebroso, dominado por forças espirituais da maldade por todos os lados. Porque hoje o que mais se ouve nos púlpitos é mensagem tenebrosa. Parece que está faltando senso de limite e assunto a muitos pregadores. O que estão fazendo com os novos convertidos e com os imaturos na fé é extremamente desonroso.



Hoje, para um pregador receber resposta do povo à sua mensagem, ele tem que apelar. E, não raro, essas apelações são exatamente as absurdas, enjoadas, cansativas mensagens sobre o "coisa ruim".




Jesus venceu o diabo por mim e por você, leitor. Não precisamos temer o que o diabo possa nos fazer. Tudo está sobre o controle de Deus. Nada passa despercebido à vigilância divina. Segundo o Salmo 121, Deus não dorme nem sequer tira um cochilo. Nada lhe é indiferente.
 
 
 
 
É exatamente assim como a Bíblia descreve a trajetória da história humana. Tudo acerca do qual frequentemente se tem a infeliz ideia de que está sendo dominado pelo diabo, está sob o domínio de Deus.
 
 
 
ESTE MUNDO TENEBROSO
 
 
 
A Bíblia verdadeiramente diz que o mundo jaz no maligno. Todavia, a expressão "mundo" não significa terra, espaço cósmico, como alguns frequentemente interpretam. Aqui João está explicando que o mundo pagão estava completamente dominado pelo pecado, vícios, desejos abjetos e desenfreados. A palavra "mundo" aqui tem a acepção de sistema. Na visão de João, o mundo estava dominado pelo mal. Evidentemente, o apóstolo de Pátmos só podia ter esta negra impressão da sociedade dos seus dias. O paganismo estava dominando de canto a canto. O pecado era o "pão de cada dia" de todos os homens da época de João. Obviamente, João não podia ter outra impressão do mundo a não ser a que descreveu a partir de sua observação: "O mundo jaz no maligno".



Agora, pegar esta passagem para endossar a ridícula ideia de um mundo tenebroso. Essa não!
 
 
 
"HÁ ALGUMA COISA DE PODRE..."
 
 
Não sei onde querem chegar com este assunto tenebroso, que faz propaganda o tempo todo do diabo. Pior: partem da antiga fórmula que frequentemente combatem de púlpito, alertando os pobres e incautos irmãos. Já que não têm base bíblica buscam uma ou duas passagens totalmente desconexas para alegarem seriedade naquilo que ensinam. O mais catastrófico disso tudo é que a maioria sabe que o assunto não passa de mais um modismo que hoje gravita sobre as igrejas evangélicas, mas nada fazem. Agora dizer o que a Bíblia não diz ou fazer a Bíblia dizer o que ela nunca dirá, constitui-se crime de responsabilidade.
 
 
O QUE PAULO ESTAVA REALMENTE FALANDO AOS EFÉSIOS
 
 
Em Efésios, capítulo 6, o apóstolo Paulo, depois de expor uma série de princípios referentes ao relacionamento de marido e mulher, de pais e filhos, de escravos e senhores, passa a exibir sua visão do mundo, com as seguintes palavras:
 
 
"Revesti-vos de toda a armadura de Deus, para que possais estar firmes contra as astutas ciladas do diabo. Pois não temos de lutar contra a carne e o sangue, e, sim, contra os principados, contra as potestades, contra os poderes deste mundo tenebroso, contra as forças espirituais da maldade nas regiões celestes."
 
 

Na época de Paulo, os judeus tinham como demônio todo e qualquer povo gentio que era contra as leis de Deus. Os termos que Paulo usa - principados, potestades, governos - são todos nomes para se referir a sistemas de morte e governos que oprimem e possuem os homens. Mas para o apóstolo não era só isso, mas o universo inteiro era um campo de batalha. O cristão não somente tem que lidar com os ataques dos homens, mas também tem que enfrentar os ataques de forças espirituais que lutam contra Deus.
 
 
Nós podemos não interpretar literalmente a linguagem de Paulo, mas sabemos por experiência que o mal é um poder ativo neste mundo.
 
 
Todos temos sentido a força da influência do diabo que trata de induzir-nos ao pecado. Este é em essência o pensamento de Paulo quando fala dos demônios.

 
Et gloria est Dei!
 

 

Rev. Paulo Cesar Lima
 
 
 

Existem Pessoas Com Mais Sorte Que Outras?

Existem Pessoas Com Mais Sorte Que Outras?

 

 Esta é uma questão que, à primeira vista, parece elementar, mas não é. E, para o total desconforto de alguns cristãos, o problema agrava-se quando nos deparamos com fatos nitidamente comprobatórios de que há pessoas que parecem receber uma “ajudinha extra” em tudo que fazem, enquanto outros, ao contrário, nada do que fazem dá certo.
 
Há histórias estranhíssimas apontando esta dolorosa realidade; histórias de pessoas que nada fizeram e nada fazem para serem melhores e, no entanto, conseguem sempre o mais difícil. Em contrapartida temos trabalhadores que se esforçam até o seu limite e não levam nada. Eu não estou falando aqui de probabilidades, mas de fatos avassaladoramente inexplicáveis e inexoráveis.
 
É indiscutível dizer que existem algumas mostragens nos episódios da vida que nos deixam sem qualquer explicação, mesmo que tentemos explicar. Pior: na tentativa de responder à questão em tela, o fazemos de maneira simplória. Na realidade, a intenção das explicações simplistas é quase sempre fechar o assunto acerca do qual não compreendemos e contra o qual nos sentimos impotentes.
 
É por essas e outras explicações anestésicas, mas nada racionais, que acabamos sofrendo do mal de Asafe, o líder dos cantores de Davi.
 
O cantor de Israel, ao sair um dia do seu casulo existencial sagrado, enfrentou a pior crise da sua vida. Para ele era algo asfixiante, esmagador: viu que os “ímpios” (os não religiosos) estavam levando a melhor ao sabor de uma vida sem Deus. Ele que apostara tudo em Deus parecia menos privilegiados. O que estava acontecendo?
 
Na verdade, quando perguntamos se há os que têm mais sorte na vida, queremos de fato fazer uma outra pergunta: por que o ímpio parece estar levando a melhor?
 
Jó e Eclesiastes são os únicos livros – em toda a Bíblia Sagrada – a ressaltarem uma maneira contrária de pensar a vida do justo e do ímpio.
 
Jó, descrito na “torá oral evangélica” como paradigma da submissão, da suportabilidade, homem de comportamento ilibado em relação à dor, é a figura mais rebelde do Antigo Testamento. É rebelde na sua maneira de tratar as interpretações acerca do sofrimento do justo: reclama, combate, insurge-se, repele qualquer explicação da ortodoxia religiosa, não aceita a dor, reivindica justiça, chama Deus a um tribunal para uma disputa justa...
 
A maneira tradicional de pensar o sofrimento de Jó é oposta a tudo o que está desvelado nas Escrituras Sagradas. Nossos intérpretes – parece – pegaram o “bonde andando” e agora não sabem para onde vão e nem têm como pará-lo. Jó, portanto, é a história de dor, angústia, sofrimento que torna o homem mais sagrado alguém de carne e osso. Além do mais, para Deus vale mais o tratamento do nosso caráter do que o nosso bem estar.
 
O autor de Eclesiastes, por sua vez, abre mão do ortodoxismo do seu tempo e se arremete contra a dicotomia determinista, que coloca o ímpio sempre em situação de desvantagem na história. O “pregador” reverbera dizendo que nem sempre isso é realidade:
 

“Sim eu sei que dizem: ‘Se você temer a Deus, tudo lhe correrá bem; mas não correrá bem para os maus. A vida deles passa como a sombra: morrerão jovens porque não temem a Deus.’ Mas isso não tem sentido. Vejam o que acontece no mundo: muitas vezes os bons são castigados, e não os maus; e os maus são premiados, e não os bons.”

 

Há mais de quinhentos anos, um filósofo grego de grande saber, considerado oráculo dos deuses, já deblaterava que algumas situações por que passamos jamais serão compreendidas racionalmente. No fundo, o velho filósofo tinha razão. De fato, nada dói tanto que a dor incompreendida. Primeiro dói porque é dor. E segundo dói pelo fato de não se saber por que está doendo.
 
Toda esta inquietação existencial é em face de um axioma cristão que se constitui premissa fundamental da religião cristã: “Se Deus está conosco, mal nenhum pode nos ocorrer”.
 
Partindo deste sufrágio cristão, o questionamento de Gideão feito ao anjo é justo: “Se o Eterno está com o nosso povo, por que está acontecendo tudo isto com a gente?” Levando-se em conta que o juiz de Israel entende – como todos nós – o fato de que a presença de Deus é sempre razão de vitória - questão fechada e incontestável para muitos cristãos – o que fazer para entender os fatos contrários?
 
A partir desta Escritura episódica e do questionamento do juiz de Israel, entendo que, com urgência, precisamos reler e reescrever o conceito de sorte e azar na história humana. Isto porque este conceito é absolutamente relativo. Já que a sorte de hoje pode se tornar no azar de amanhã e vice-versa. Mais: não há quem viva só de azar nem tampouco de sorte; esses elementos circunstâncias por vezes se alternam na vida.
 
Acompanhe o meu raciocínio e descubra a gangorra da vida entre a sorte e o azar:

 

Fábio amava Alcione. Mas Alcione nada queria com Fábio – que azar de Fábio. Depois de tantas tentativas, Fábio consegue convencer Alcione de se casar com ele – que sorte de Fábio. Após o casamento, o casal descobre que não pode ter filhos – que azar de Fábio e Alcione. Fábio e Alcione conseguem tratamento e o esperado filho nasce – que sorte. Após o nascimento da bela criança, Alcione morre – que azar para Fábio. O menino Filipe cresce e quando completa a idade de 18 anos o pai lhe presenteia com um belo cavalo puro sangue – que sorte. A primeira cavalgada com o belo cavalo Filipe cai e quebra a perna – que azar. Dias depois, chega uma convocação do exército para o jovem Filipe, para que este se apresente com urgência a fim de ser enviado para o campo de guerra; Filipe não pode ir pelo fato de ter sua perna quebrada – que sorte. Filipe...

 

Como o leitor pode notar, eu poderia continuar esta história interminável. No entanto, com ela eu só quero destacar a alternância que há entre a sorte e o azar e como os dois elementos se ajustam na existência humana, revelando-nos que não há determinismo em nenhum desses elementos.
 
Do exposto, para amenizar a dor do leitor, deixo esta palavra de consolação:

 
A maioria dos homens que conseguiram se tornar os mais
ricos do mundo veio das classes menos favorecidas.
 
 
 
 
Et gloria est Dei!
 
Rev. Paulo Cesar Lima 
 
 
 

 

TEOLOGIA DO SOFRIMENTO

Teologia do Sofrimento

 

 O ser humano é natural e sadiamente propenso à alegria de viver, quando não apenas ao prazer do momento. “Mas o sofrimento insiste em ser notado. Deus sussurra em nossos prazeres, fala em nossa consciência, mas grita em nosso sofrimento: ele é o seu megafone para despertar num mundo surdo, escreve C. S. Lewis em seu célebre The Problem of Pain” (O Problema do Sofrimento). “Não há dúvida”, continua Lewis, “de que o sofrimento como o me­gafone de Deus é um instrumento terrível, podendo levar à rebelião final, que não dá lugar ao arrependimento. Mas ele fornece também a única oportunidade que o perverso pode ter de emendar-se.” É lógico que essa é uma interpretação religiosa do sofrimento que vai além dos dados da antropologia. Tremendo mas ambíguo poder do mal, cujo valor ou contravalor depende de como o sofredor interpreta o próprio sofrimento. Talvez tenhamos maior objetividade para com o sofrimento dos outros. Deus nos livre de fazer a apologia do mal, nem sequer da dor ou do sofrimento: é puro fogo em nossas mãos. Livre-nos de aumentar sua carga para os outros. Isto nos lembra os políticos-Janus: Uma face para lastimar de público o arrocho salarial e os horríveis sofrimentos do povo que os elege, a outra face para tomar as decisões que engor­dam seus próprios emolumentos, suas mordomias, seus privilégios, inclusive a custo da fome do povo, que os elege.
 
 
Eu já li dezenas de livros onde seus autores, na tentativa de amenizar a dor de alguém, envidam todos os esforços no sentido de tentar explicar a teologia da dor, elaborando uma espiritualidade da doença, da provação, do sofrimento padecido em honra da fé na pessoa de Jesus ou em consonância com qualquer dogma que seja. Alguns desses autores, curiosamente, apontam na direção de que Deus quer fazer conosco um tratamento e por isso devemos resistir até o final. Outros, mais rigorosos, apelam para o dogma da retribuição, inferindo que por trás de toda a dor está alguma falha ou culpa não confessada. Um terceiro grupo, extremamente simplista, deduz que a dor que alguém esteja passando trata-se de uma “prova” divina, que, afinal, redunda em glória e exaltação. Há aqueles ainda que culpam o diabo, e pronto. Finalmente, há pouco tempo um grupo de pessoas excêntricas começou a adotar a idéia de uma possível influência hereditária. Ou seja: sofremos por causa da nossa árvore genealógica maldita.
 
 
Muito bem. A primeira opinião é falha, porque mostra um Deus perverso sob o pressuposto de pro­filaxia. A segunda apresenta a imagem de um Deus barganhador dos louvores humanos. A terceira é a forma mais medíocre de solucionar o problema da dor, porque faz de Deus o seu autor. A quarta, ao contrário da primeira, exclui Deus do cenário da história de quem sofre, porque, segundo seus advogados, o sofredor está sempre nas mãos do diabo. A quinta e última peca porque confunde problema bio-genético-hereditário com questões teológicas.
 
 
Estas respostas a dor vêm fazen­do parte do cristianismo há muito tempo: desde as culturas e­vangélicas mais remotas até as mais modernas, levantando as piores polêmicas, bem como criando os mais tendenciosos silogismos filosóficos sobre a existência do bem e do mal, tema que foi encarnado pela teologia medieval e que, por insistência, apareceu em boa parte do tempo na teologia con­­temporânea.
 
 
Eu não tenho dúvidas de que estamos pisando em terreno abso-­ lutamente desconhecido. Desconhecido, porque a teologia da dor precisa ser esclarecida, contudo de forma menos espiritualizada.
 
 
Queremos abrir os olhos, olhos novos, sobre o sofrimento como fenômeno, sem substituir a dogmá­tica e a espiritualidade das religiões, cuja pedra de toque é precisamente a maneira como se saem do con­fronto com o sofrimento e o mal em geral.
 
 
É de Shusaku Endo, eminente intelectual japonês, cristão, as inda­gações no seu notável romance, Vulcano. Nele ele questiona: “Será que os japoneses precisam mesmo do cristianismo, já que não possuem o sentido do pecado? Sem sentido do pecado, como motivar a procura de redenção (do pecado)? Será que podemos distinguir a verdadeira compaixão do desejo de controlar os outros, a pretexto de salvar suas almas?”
 
 
Hubert Lepargneur discute o assunto sobre a questão do sofrimen­to de forma inteligente apresentan­­do o seguinte arrazoado: “Mas quem pode afirmar que o mal em si existe? O que existe segura­mente é o encontro do mal com o sujeito humano (neste sentido admitimos o testemunho: O mal existe, eu o encontrei). Temos de ficar atentos ao mal antes de sua rotulação: ‘mal’ não será antes do mais um julga­mento de valor para apontar aquilo que me contradiz? que se opõe a mim? O mal em si, se existe, é algo indefinido, ambíguo: pode servir para o bem ou para o prejuízo do sujeito humano. Isto, antes mesmo de falarmos em ideologia, porque a crença vai ajudar o indivíduo a ca­racterizar o mal segundo categorias rígidas, pré-determinadas como numa tarifa medieval de pecados ou moderna de preços.”
 
 
Não sem fundamento, os filó­sofos afirmam que o Ser [Deus] existe, por si, mas não o Mal, isto é, o mal absoluto. Existem males rela­­tivos, que geram sofrimentos subje­tivos, mas não por isso irreais. O que é a civilização se não um enorme Sistema para combater males relati­vos? Produz bens de ser­viços para vencer males rela­tivos: a fome gera todo o sis­tema da agricultura e da indús­tria do agro-alimentício; a nu­dez que nos pode tornar vítimas do frio e do sol arden­te gera o sistema da produção dos te­cidos e vestidos; a sujeição às intempéries e o desejo de privacidade geram o sistema habitacional e assim por diante; a insegurança gera os sis­temas do Estado e dos seguros sociais de todo tipo. Sem ameaça da dor e do sofrimento, o que seria da civilização humana? Consulto mé­dico e aceito cirurgia porque alguma dor me está incomodando; e se não for sofrimen­to físico mas mental, vou consultar psicólogo, psi-­quiatra e até pago caro para me deitar no divã de algum psicanalista de reno­­me. Pergunto sinceramente, se desaparecesse da humanidade não apenas a dor mas até o sofrimento e qualquer ameaça de sofrimento, o que ocorreria com a civilização humana? Respondem os utopistas. Isto destruiria as civilizações terráqueas e talvez aniquilaria nossa frá­gil espé­cie. Ela vive de esperança de felicida­­de e de certeza de dor.

 

Et gloria est Dei!

 
Rev. Paulo Cesar Lima

O OUTRO É O INFERNO

O OUTRO É O INFERNO

 
 

É de Sartre a sentença lapidar: “O outro é o inferno”.


A razão que leva o então conhecido filósofo existencialista francês a esta intrincada conclusão decorre da diminuição da dignidade humana por parte da sociedade em que vivia. Seja como for, Sartre quer pontuar a difícil convivência de dois seres humanos diferentes ou, ainda, quer ressaltar que o maior inimigo do homem é o próprio homem.  


Não é de hoje que os seres humanos têm dificuldades de se relacionar com pessoas diferentes. Algumas sociedades, severas neste particular, optaram por uma solidariedade grupal. Ou seja, os de “dentro” são “irmãos”; os de “fora” não têm valor.


A ciência da religião, salvo melhor juízo, destaca estes entreveros desde que o cristianismo se tornou um sistema fechado e absolutamente preconceituoso. Na melhor das avaliações do comportamento cristão em face de ter o “outro” completamente estranho para conviver, a intransigência é algo ainda de bom tamanho. Revela, também, a quase impossibilidade de convívio que tem pessoas diferentes.


Os exemplos mais clássicos na história cristã sobre a intransigência, sem sombra de dúvida, são a “Santa Inquisição” e a “Noite de São Bartolomeu”, dois genocídios praticados pela própria igreja. Ainda pode se somar a estas manchas históricas o extermínio de protestantes na ilha de Villegaion ou, ainda, a matança dos índios do Brasil a mando da igreja romana.


Para não ficar apenas com as chacinas cometidas pela Igreja Romana, citamos aqui os massacres impingidos aos romanos pelos calvinistas e algumas igrejas reformadas, com destaque para os anabatistas.


Temos de fato muitos problemas de intransigência, aberrações, fanatismos. A pergunta é: o que fazer para sair desta interminável crise? Uma das mais presentes crises que passa nossa sociedade é o conflito de gerações. Essa desinteligência vem se arrastando pelo tempo afora afrontando as mentes mais brilhantes. Não há aquilo do grupo mais velho abrir passagem para os mais novos que estão chegando.


No livro Fundamentalismo de Leonardo Boff, lemos que

 

“o fundamentalismo não é uma doutrina. Mas uma forma de interpretar e viver a doutrina (...) Fundamentalismo representa a atitude daquele que confere caráter absoluto ao seu ponto de vista (...) quem se sente portador de uma verdade absoluta não pode tolerar outra verdade, e seu destino é a intolerância. E a intolerância gera o desprezo do outro, e o desprezo, a agressividade, e agressividade, a guerra contra o erro a ser combatido e exterminado.

 

Assim é caracterizado o fundamentalismo por Luis Mosconi no seu livro Para uma Leitura Fiel da Bíblia:

 

O fundamentalismo caracteriza-se pelas seguintes posturas: O absolutismo: certos princípios devem ser aceitos sem comentários. Não há espaço para dúvidas ou debates. As verdades são imutáveis e estão acima de tudo; a vida deve se submeter a elas. O institucionalismo: as instituições tradicionais são intocáveis: os poderes constituídos, as autoridades, a organização das igrejas, das religiões e das sociedades. As mudanças prejudicam. Portanto nada de renovação. O correto é somente o que vem do passado. O autoritarismo: todo poder é dado a algumas pessoas eleitas pela instituição. Essas pessoas defendem as verdades e a elas deve-se obedecer cegamente, sem discussão. Não há participação democrática. O fanatismo: tudo é visto em função do grupo ao qual se pertence. O que conta em primeiro lugar são os interesses do grupo. Os que não são do grupo devem se conquistados ou rejeitados como pessoas perversas. Existe um clima agressivo, de ataque e defesa, além de uma verdadeira lavagem cerebral... Usa-se uma linguagem ameaçadora e atemorizadora. Fala-se muito em pragas e castigos, em guerra santa contra os infiéis e os inimigos de Deus. O desconhecimento da realidade: as situações históricas não interessam. Não adianta lutar por mudanças sociais ou políticas...provoca fanatismo e resignação.
 

           Afirma ainda Luiz Mosconi sobre o fundamentalismo:

 

...A vida fica amarrada, presa  ao texto, não gera criatividade, é repetitiva. Não leva a uma caminhada de luta em favor da vida do povo. Reduz a Bíblia a um livro sem história, sem passado e sem presente. Não se preocupa com um projeto histórico de transformação. É uma leitura individualizante, ligada a interesses imediatos, em que há muita manipulação e abusos. As pessoas muitas vezes são utilizadas e manipuladas. É uma leitura fora da história, aérea, não situada no contexto sociopolítico. Gera concordismos: procura estabelecer parale- los simplistas com situações de hoje. Não respeita a alteridade da Bíblia, quer dizer, não trata a Bíblia como um texto produzido em outras épocas, em outras situações e culturas. Lemos no evangelho não sinóptico: “E os escribas e fariseus trouxeram-lhe uma mulher apanhada em adultério. E pondo-a no meio, disseram-lhe: Mestre esta mulher foi apanhada, no próprio ato, adulterando. E na lei nos mandou Moisés que as tais sejam apedrejadas. Tu, pois, que dizes? (...) aquele que dentre vós estiver sem pecado seja o primeiro que atire pedra contra ela” (Jo 8.3,4,5,7).



             Et gloria est Dei!
 
Rev. Paulo Cesar Lima


 

DOENÇA OU ESTADO DE ESPÍRITO?

Doença ou estado de espírito?

 
 

 
O convívio com pessoas mal-humoradas é indiscutivelmente muito embaraçoso. São seres pessimistas, monossilábicos, arrasadoramente constrangedores. Qualquer um que deles se aproxima – mesmo num contato social rápido – passa dificuldades. É preciso bastante tato, cuidado com as palavras, jogo de cintura e paciência redobrada para lidar com um mau-humorado e se fazer gostar por ele.
 
 
Falando do mal-humorado, que é uma pessoa quase inconvivível, o Novo Testamento utiliza-se de expressões que estão muito ligadas a questões de resistência. “Longanimidade” é uma delas. Trata-se de uma palavra composta, de origem grega, que significa “longe da ira”. Enquanto a palavra perseverança refere-se à resistência às adversidades, longanimidade é um tipo de perseverança no que diz respeito ao convívio com pessoas difíceis. Isto quer dizer que não somos nós que escolhemos aqueles com os quais queremos conviver. Deus é quem, por vezes, coloca em nossa vida aqueles (ou aquelas) de cujo convívio aprenderemos a ser mais gente. Só conseguiremos amar de verdade quando este amor se tornar uma opção, a despeito de todas as situações contrárias. 
 
 
Mas aquilo que era considerado apenas um jeito de ser, herança de família, ou ação demoníaca, desde 1980, entrou na lista de doenças da Associação Psiquiátrica Americana e recebeu o nome de distimia. Dois anos depois, o Código Internacional de Doenças confirmou o conceito e a Organização Mundial de Saúde lançou, em diversos países, um programa sobre o diagnóstico e o tratamento da distimia.
 
 
Calcula-se, em todo o mundo, 170 milhões de pessoas, ou 3% da população, sejam de mal-humorados. A doença atinge crianças e adultos, ricos e pobres. As mulheres a partir de 20 anos de idade são as que mais sofrem com o problema e representam o dobro do número de casos masculinos. Nas crianças e adolescentes o mau humor também é freqüente e atinge 50% do total.
 
 
Para o psiquiatra Antônio Egídio Nardi, professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro e um dos responsáveis pelo estudo da distimia no Brasil, não se pode confundir o mau humor passageiro, causado por engarrafamento de trânsito ou briga familiar, por exemplo, com o caso clínico, em que o indivíduo de­ve procurar tratamen­to médico.
 
 
 
A LENTE DO MAL-HUMORADO
 
Necessita de ajuda quem está sempre de mau humor, não con­segue ver o lado bom das coisas, critica tudo e a todos, não sente prazer nas coisas que faz, vive cansado e pessimista. “É um infeliz, que acha que tem sempre um chato ao seu lado e que es­tá tudo errado no mundo”, explica o médico. Outras características da distimia são a falta de apetite e de concentração e o sentimento de culpa (a pessoa se julga responsável por tudo que acontece de errado ao seu redor).
 
De acordo com Dr. Nardi, o pior destes sintomas é que podem levar a outros problemas psíquicos, como o alcoolismo, vício em tranquilizantes, insônia ou sono excessivo. Dependendo da gravidade do caso, a pessoa pode tornar-se um suicida. Antes, porém, do aparecimento desses sintomas podem surgir outros sinais, de caráter físico, como doenças cardiovasculares, câncer e distúrbios imunológicos. Depressivos, os mal-humo­rados ficam com a libido em baixa e podem ter comprometido seu desempenho sexual.
 
 
O distímico às vezes se recusa a admitir que está doente. Somente dois terços deles procuram a­juda médica. Geralmen­­te, um clínico faz o diagnóstico de depressão, segundo o doutor Nar­­di. Ele ressalta o aspecto da autodefesa. “O mal-humorado tem sempre u­ma desculpa: o chefe chato, o tempo fechado, a crise financeira. Ele não acha gra­ça nem mesmo quando acerta na lo­teria”, garante o psiquiatra.
 
         QUANDO PROCURAR AJUDA MÉDICA
 
Quando os sintomas já duram aproximadamente dois anos, é hora de cair na real e enfrentar o tratamento, à base de medicamentos e psicoterapia simultaneamente. Ele deve durar pelo menos dois anos, mas em dois meses já é possível retomar o gosto pela vida e ver o lado bem-humo­rado das coisas e pessoas.
 
 
No entanto, os especialistas alertam: durante o tratamento podem ocorrer tremores, sonolência, náuseas, dores de cabeça e tonteiras, devido ao uso prolongado de antidepressivos. Por outro lado, a vontade de chutar tudo e todos desaparece.
 
 
As causas da distimia ainda são pouco conhecidas. Alguns estudiosos acreditam que estejam relacionadas aos hormônios femininos, o que poderia explicar a maior incidência nas mulheres. Outros acreditam que alguns casos podem estar relacionados a traumas na infância, abuso sexual e convivência com alcoólicos. Há também pessoas que se tornam mal-humoradas depois de ter uma doença séria, como diabetes ou câncer.

 
 
A grande diferença da distimia para outros tipos de depressão é que ela é crônica e um grande transtorno psiquiátrico. Mas, segundo a Bíblia, “o coração alegre ser­ve de bom remédio, mas o espírito abatido virá secar os os­­sos” (Pv 17.22).
 
 
 


        Et gloria est Dei!
 
Rev. Paulo Cesar Lima