sexta-feira, 25 de abril de 2014

O PESAR DOS RICOS


O PESAR DOS RICOS

 

 

Comentando sobre o polêmico e crônico problema do Brasil – a desigualdade social – o historiador americano Thomas Skidmore apontou a ausência do sentimento de culpa nas elites brasileiras como o x da questão.
 
 
O ex-professor de Harvard diz que o rico brasileiro não tem sentimento de culpa. O católico, cuja moral está mais presente na cultura brasileira, sabe que será salvo a cada domingo. “Ele vai até o padre, consegue uma solução para os pecados e volta feliz para casa. Livre para pecar mais uma semana. A elite americana, no entanto, por causa da influência protestante, tem mais sentimento de culpa”, assevera o professor.
 
 
De acordo com Skidmore, o americano rico fica envergonhado por ter muito dinheiro. Na Califórnia – diz ele – os empresários que ficaram milionários com a internet aos 35 anos andam desesperados atrás de idéias para criar fundações. Isso acontece porque podem deduzir, do imposto de renda, os gastos feitos em programas sociais. Mas não é só isso. Há também o sentimento de que é necessário partilhar o dinheiro. Segundo Thomas, tal comportamento pode estar ligado à influência calvinista que ensina que o protestante não sabe se é salvo ou não.
 
 
A colocação de Skidmore, embora discutível, tem a sua pertinência. Primeiro porque o aparecimento intermitente de sentimento de culpa nas elites brasileiras, se muito, as conduz a um acerto religioso de proporções individualistas, nada que transcenda a pessoa do culpado. Aqui no Brasil, a culpa social parece se resolver com os chamados “apagões mentais”, produto da teologia da prosperidade, que sugere a riqueza como sinal de bênção de Deus, uma colagem muito mal feita do calvinismo histórico. Já as elites americanas, com toda a sua empáfia, preferem a partilha. Segundo, porque toda prática de injustiça chega sempre a um limite, onde os seus praticantes são fragilizados por um sentimento de culpa gerador dos seus fantasmas psicológicos. Isto porque não há ninguém que consiga viver tranquilo por muito tempo praticando maldade e injustiça.
 
 
Há um episódio bíblico muito interessante que ratifica esta colocação.
 
 
As expedições opressoras dos midianitas contra Israel, no tempo de Gideão, pintam o quadro sombrio de dor por que passa o povo quando expropriado da sua dignidade de viver como livres criaturas de Deus.
 
 
Mas, enquanto esta esmagadora realidade tange o povo oprimido de Israel, o opressor também é acometido por um aterrador inconsciente coletivo. Sonham sua derrota e imaginam-se esmagados pelos seus vassalos (Jz 7.13,14).   
 
 
Gideão estava no inconsciente coletivo dos midianitas. Após infringir tantos crimes contra a sociedade israelita, os filhos de midiã se sentem frágeis e amedrontados emocionalmente.
 
 
Conforme idéia de alguns especialistas, todo opressor que, oprimindo, perde o senso da crueldade praticada, com o passar do tempo entra em estado de terror interior; um pesar pelo medo da retribuição.
 
 
O outro lado da moeda – que, acredito, ser o mais grave – é a falta de pudor que às vezes permeia algumas culturas cristãs, que se exacerbam na sua busca por santidade, com perda quase que total da visão do ser humano que sofre. Isto foi o que aconteceu na época dos puritanos, nos Estados Unidos, que, ávidos por viverem uma vida de pureza, terminaram esquecendo o sofrimento que impingiam aos negros escravos.
 
 
Apesar de sabermos o que está por trás da cultura da culpa engendrada pelos anglo-saxões contra a América Latina, será que o grande escape para os excluídos do Brasil é que um dia os ricos desta terra possam sentir algum pesar (se converterem realmente a Cristo) e, convencidos do seu pecado social, partilhem dos seus bens com os pobres? (Lc 19.8).
 
 
Et gloria est Dei!
 
 


Rev. Paulo Cesar Lima

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