O PESAR DOS RICOS
Comentando
sobre o polêmico e crônico problema do Brasil – a desigualdade social – o
historiador americano Thomas Skidmore apontou
a ausência do sentimento de culpa nas elites brasileiras como o x da questão.
O
ex-professor de Harvard diz que o rico brasileiro não tem sentimento de culpa.
O católico, cuja moral está mais presente na cultura brasileira, sabe que será
salvo a cada domingo. “Ele vai até o padre, consegue uma solução para os
pecados e volta feliz para casa. Livre para pecar mais uma semana. A elite
americana, no entanto, por causa da influência protestante, tem mais sentimento
de culpa”, assevera o professor.
De
acordo com Skidmore, o americano rico
fica envergonhado por ter muito dinheiro. Na Califórnia – diz ele – os
empresários que ficaram milionários com a internet aos 35 anos andam
desesperados atrás de idéias para criar fundações. Isso acontece porque podem
deduzir, do imposto de renda, os gastos feitos em programas sociais. Mas não é
só isso. Há também o sentimento de que é necessário partilhar o dinheiro.
Segundo Thomas, tal comportamento pode estar ligado à influência
calvinista que ensina que o protestante não sabe se é salvo ou não.
A
colocação de Skidmore, embora discutível, tem a sua pertinência.
Primeiro porque o aparecimento intermitente de sentimento de culpa nas elites
brasileiras, se muito, as conduz a um acerto religioso de proporções individualistas,
nada que transcenda a pessoa do culpado. Aqui no Brasil, a culpa social parece
se resolver com os chamados “apagões mentais”, produto da teologia da
prosperidade, que sugere a riqueza como sinal de bênção de Deus, uma colagem
muito mal feita do calvinismo histórico. Já as elites americanas, com toda a
sua empáfia, preferem a partilha. Segundo, porque toda prática de injustiça
chega sempre a um limite, onde os seus praticantes são fragilizados por um
sentimento de culpa gerador dos seus fantasmas psicológicos. Isto porque não há
ninguém que consiga viver tranquilo por muito tempo praticando maldade e
injustiça.
Há
um episódio bíblico muito interessante que ratifica esta colocação.
As
expedições opressoras dos midianitas contra Israel, no tempo de Gideão, pintam
o quadro sombrio de dor por que passa o povo quando expropriado da sua
dignidade de viver como livres criaturas de Deus.
Mas,
enquanto esta esmagadora realidade tange o povo oprimido de Israel, o opressor
também é acometido por um aterrador inconsciente coletivo. Sonham sua derrota e
imaginam-se esmagados pelos seus vassalos (Jz 7.13,14).
Gideão
estava no inconsciente coletivo dos midianitas. Após infringir tantos crimes
contra a sociedade israelita, os filhos de midiã se sentem frágeis e
amedrontados emocionalmente.
Conforme
idéia de alguns especialistas, todo opressor que, oprimindo, perde o senso da
crueldade praticada, com o passar do tempo entra em estado de terror interior;
um pesar pelo medo da retribuição.
O
outro lado da moeda – que, acredito, ser o mais grave – é a falta de pudor que
às vezes permeia algumas culturas cristãs, que se exacerbam na sua busca por
santidade, com perda quase que total da visão do ser humano que sofre. Isto foi
o que aconteceu na época dos puritanos, nos Estados Unidos, que, ávidos por
viverem uma vida de pureza, terminaram esquecendo o sofrimento que impingiam
aos negros escravos.
Apesar
de sabermos o que está por trás da cultura da culpa engendrada pelos
anglo-saxões contra a América Latina, será que o grande escape para os
excluídos do Brasil é que um dia os ricos desta terra possam sentir algum pesar
(se converterem realmente a Cristo) e, convencidos do seu pecado social,
partilhem dos seus bens com os pobres? (Lc 19.8).
Et gloria est Dei!
Rev. Paulo Cesar Lima
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