Os
livros de Eclesiastes e Jó manifestam a tendência dos homens sempre pensarem em
Deus em termos de recompensa e castigo.
A atriz Katiuscia Canoro,
intérprete da personagem Lady Kate em um programa da Rede Globo, sempre
termina o seu quadro com o bordão: “tô pagano!”.
O “tô pagano!” de Lady Kate está
fazendo sucesso nos arraiais evangélicos. Hoje o comportamento de um número
assustador de evangélicos assemelha-se ao crédito-recompensa “tô pagano!”. É
uma forma de pressionar D’us, para que suas bênçãos cheguem mais rápido.
O dantesco disso tudo é que crentes
evangélicos – os quais deveriam ter entendimento bíblico – quando incentivados,
induzidos, programados por pregadores espertos e charlatães, caem na esparrela
do “toma-lá-dá-cá”, ou seja: “Pagou?! Levou a Bênção!”, afinal de contas D’us é
obrigado a responder suas orações repletas de delírios e caprichos, porque...
“tão pagano!”.
CULTURA DA BARGANHA
A “cultura da barganha”, que sempre
fez parte das igrejas de “curas divinas”, agora aparece com força total nas
reuniões pentecostais (não clássicas) e pós-pentecostais. É o famoso “quem paga
leva a bênção!” – “Tô pagano!”.
Falando em pagar, evoco a lembrança
da história contada por um dos alunos do SAL – Seminário Avançado Para Líderes
– que já frequentou uma dessas “igrejas de cura divina”. Segundo ele, certa vez
ele estava com muita vontade de participar de uma “dessas campanhas”, mas tinha
que pagar “trezentos reais”, e ele só tinha a metade do dinheiro. Então foi ao
pastor para saber se podia participar da campanha com os cento e cinquenta
reais. O pastor disse que era trezentos e não podia fazer concessão. Não
conseguindo, apelou ao bispo, que lhe disse o seguinte: “Nós não estamos
forçando ninguém a dar trezentos reais, mas também não somos obrigados a levar
pedido de oração de ninguém que não der os trezentos reais!”. Isso chega a
ser dantesco.
Mas a coisa está num ritmo tão alucinante que cada igreja
procura inventar o jeito mais eficiente de tirar dinheiro do povão. Hoje tem
até “UNÇÃO DO NEGOCIADOR”. Ah! Para com isso!
Agora, como pode um povo estar sendo enganado e mesmo assim
aceitar coisas tão grotescas e, ainda, participar com os seus últimos centavos?
Será que isso é a derrocada de todos os ensinamentos de Jesus, no Novo
Testamento, em relação aos pentecostais e pós-pentecostais brasileiros?
A “cultura da barganha” está hoje entranhada nas artérias
pentecostais. Os ensinos errados da Bíblia quanto à prosperidade, salvação,
consagração, santidade... distorceram as verdades bíblicas e fizeram com que o
povo aprendesse a ter uma relação com Deus à base de troca. Então você regateia
com Deus reivindicando dele alguma coisa, porque, a seu ver, você tem crédito
com Ele, pois “Tô pagano!”
No atual momento pelo qual a igreja passa é absolutamente
comum vermos figuras grotescas, caricatas, burlescas usando o púlpito para
fazer renascer a cultura da barganha. Isto porque pastor que prega o que o povo
QUER OUVIR faz da porta da tesouraria uma antessala do céu. Pastor que prega o
que o povo PRECISA OUVIR, vive do “pão nosso de cada dia”.
Um famoso pregador pentecostal lançou
em sua igreja a campanha “O milagre vai acontecer.” Nele, o ator/pregador trás
orientações práticas de como o milagre poderá acontecer. Uma delas é sacrificar
o valor simbólico de R$ 7,00 (sete reais), que deverá ser enviado através de
depósito ou boleto bancário ou transferência eletrônica para uma de suas contas
bancárias, pois é só pagar que acontece.
Caso recente também ocorreu numa igreja pentecostal onde as
pessoas foram motivadas e induzidas a darem o seu melhor para D’us. Uma dessas
pessoas que deram o que não podiam, embalada pelo “tô pagano!” comprou um
carro. Pagou o primeiro mês, o segundo, mas no terceiro em diante não teve mais
condição. Então apelou ao pastor que o incentivou a dar tudo que tinha para que
o ajudasse. A resposta do pastor foi fria e direta: “Não mandei o irmão
comprar carro nenhum!”. E arrematou: “O irmão tem que andar de ônibus!”
Por vezes, ouve-se – aqui, ali – histórias de pessoas que, em
nome de um “D’us caricaturado”, “ofertam” o que não podem, e em razão disto
passam a exigir o cumprimento de suas promessas.
Não é possível: ou somos bobos demais ou estamos acomodados
no “engana que eu gosto!”, porque comprar “CAPA UNGIDA” de alguém que diz que o
“senhor” o mandou vender e ainda por 1000 reais cada uma, é abrir mão da razão,
da coerência. do bom senso e da sanidade.
A gente quer ver a igreja local liberta desses instrumentos
de controle, dessas picaretagens e pirotecnia, desses contornos
mágico-supersticiosos imantando objetos, coisas e chamando-os de ungidos, e aí
você ouve que algumas igrejas estão com práticas dantescas, charlatanismo
barato, num exercício de domínio de alma e alienação de cabeça. Isso é uma
aberração.
A igreja atual precisa passar por uma transformação. Mas só
podemos transformar a igreja e depois o mundo através da RENOVAÇÃO DO NOSSO
ENTENDIMENTO. O real entendimento do Evangelho de Cristo pode mudar a
sociedade. Isto significa que o entendimento distorcido do evangelho pode
agravar o mal na sociedade. Se não entendermos os valores cristãos da maneira
como nos foram passados por Jesus, nos tornaremos disseminadores do mal. O
mundo está indo de mal a pior porque não está havendo RENOVAÇÃO DO ENTENDIMENTO
nas igrejas. Nosso modo de pensar, de entender a vida, ainda é o mesmo, com
pequenos ajustes. Estamos com corpo de crente, mas nossa “cabeça” continua
homologável e conformada.
Aliás, boa parte das mensagens pregadas pelos prega-DORES
brasileiros nos aponta quão despreparados estão nossos atalaias:
“Suas
mensagens são rasas, sem substância, empobrecidas teologica- mente, cheia de
modismos, unções do jeitinho brasileiro, decretos e determinismos, os quais
têm reverberado vergonhosamente em todo território nacional”.
Em
nome do “D’us” muita gente vive vida
nababesca, mercadejando o evangelho. Assusta-me o fato de que alguns, em nome
de uma espiritua-lidade cristã, têm cobrado um “pequeno valor simbólico de
R$ 7,00” para experimentar o milagre de Deus em suas vidas. Ora, que
Cristianismo é esse? Que evangelho é esse? Sem nenhum receio afirmo que esse
não é o cristianismo pensado, idealizado e passado a nós por Jesus, e nem
tampouco o Evangelho da Bíblia, antes o evangelho que alguns dos evangélicos
fabricam!
O
que fazer com o “tô pagano!” de uma multidão de evangélicos que se transforma
em credores de Deus em vez de serem apenas seus servos? Como dizer ao povo que
Deus não é D’us de recompensa, mas de Graça? O que fazer com igrejas que deixaram
de ser comunidade da Palavra para se tornarem comunidade da barganha?
Respondo a essas e outras perguntas com uma parte da bela
crônica de um escritor evangélico, com a qual concordo,
“não dá pra
vivermos vida cristã de profecia em profecia, de decreto em decreto. Mais do
que nunca, é hora de regressar à Palavra de Deus, de redescobrir os seus
preciosos tesouros, de fazer das Sagradas Escrituras a referência de fé e de
comportamento”.
Que tenhamos brio e coragem para mudar o “tô pagano!” habitual
de algumas igrejas pentecostais e pós-pentecostais para o “Ele [Cristo] já
pagou!” da Bíblia Sagrada!
Termino esta reflexão fazendo minhas as palavras do apóstolo
Paulo:
Porque
já sabeis a graça de nosso Senhor Jesus Cristo que, sendo rico, por amor de vós
se fez pobre; para que pela sua pobreza enriquecêsseis.
Rev. Paulo Cesar Lima da Silva
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